sexta-feira, 22 de agosto de 2025

Do FUNDECANA ao Projeto do Semiárido: a história volta a se repetir?

 

Retirei este trecho ipsis litteris da minha dissertação de mestrado, das páginas 146 a 148, intitulada “O Desafio do Fomento à Industrialização em Áreas de Economia de Extrativismo Mineral: o Caso do FUNDECAM, Campos dos Goytacazes-RJ”. O trabalho foi apresentado ao Programa de Pós-Graduação em Planejamento Regional e Gestão de Cidades da Universidade Candido Mendes – Campos/RJ, para obtenção do grau de Mestre em Planejamento Regional e Gestão de Cidades. Orientador: Prof. José Luís Vianna da Cruz, DSc. Local: Campos dos Goytacazes-RJ, setembro de 2015.

Na ocasião, tive a oportunidade de estudar esse importante Fundo de Fomento de Campos, cuja história é amplamente conhecida.

Faço a presente postagem para contribuir com o debate atual em torno do veto presidencial ao PL do semiárido nas regiões Norte Fluminense e Noroeste. O intuito é oferecer elementos que possam ser úteis e, ao mesmo tempo, demonstrar que, mais uma vez, as forças do setor sucroalcooleiro de Campos — historicamente beneficiadas por recursos públicos, como comprovam leis e decretos analisados em nossa pesquisa — articulam-se em busca de novos aportes financeiros oriundos do erário. Na nossa avaliação, recursos nunca faltaram para esse segmento e, paradoxalmente, a região permanece em grave marasmo econômico.

Importa ressaltar que os valores concedidos ao setor sucroalcooleiro, destacados a seguir, estão em valores nominais, sem atualização monetária. Caso necessário, podem ser corrigidos pelo IPCA, o que evidenciaria ainda mais o volume de recursos destinados ao setor.


O FUNDECANA

“O FUNDECANA não constitui um fundo separado do FUNDECAM. Trata-se de um Programa de Revigoramento da Lavoura de Cana-de-Açúcar, instituído pela Lei Municipal nº 7.829/2006, como linha especial de financiamento dentro do FUNDECAM. Rege-se atualmente pelo Decreto nº 256/2010, que o denominou ‘Novo FUNDECANA’ para fins de divulgação, identificação contábil dos recursos aplicados e análise de resultados, conforme disposto em seu artigo 2º.

Esse programa segue os mesmos critérios dos empréstimos do FUNDECAM, incluindo garantias e taxas de juros. Em casos de inadimplência, as operações financeiras ficam submetidas às regras do mercado, como ocorre nos contratos gerais do fundo. O operador financeiro é o Banco do Brasil, conforme o Decreto nº 256/2010. Por ser uma linha especial de financiamentos, exige que uma entidade ou cooperativa ligada ao setor canavieiro se responsabilize pela consignação dos recursos. O objetivo é exclusivamente o revigoramento da lavoura de cana.

Confirmando o que foi afirmado, o §4º do artigo 3º do Decreto nº 256/2010 dispõe:

A Unidade Consignatária, ao executar o projeto junto ao Beneficiário credenciado, deverá ser auxiliada por uma ou mais pessoas jurídicas de atividade industrial processadora de cana-de-açúcar ou derivados, denominadas para efeito deste Decreto como Unidades Integradoras do ‘Novo FUNDECANA’, desde que consideradas idôneas e que apresentem certidões de regularidade fiscal perante as Fazendas Públicas Municipal, Estadual e Federal, podendo assumir, se necessário, o encargo de garantidoras da restituição dos recursos financeiros fornecidos pelo FUNDECANA.

A entidade responsável pelo recebimento dos recursos deve, obrigatoriamente, abrir conta no Banco do Brasil para depósito das liberações, após aprovação pelo CG de toda a documentação e do projeto contemplado. Empresas do ramo agroindustrial da economia local, especificamente do segmento sucroalcooleiro, contempladas pelo programa desde sua criação pela Lei nº 7.829/2006, receberam do FUNDECAM, entre 2007 e dezembro de 2014, o montante de R$ 27 milhões.

Embora instituído em 2006, o primeiro empréstimo ao setor ocorreu em 06/06/2007, com contrato de mútuo no valor de R$ 10 milhões destinado à Cooperativa Mista dos Produtores Rurais Fluminense, vinculada à Cooperativa Agroindustrial do Estado do Rio de Janeiro (COAGRO), arrendatária da Usina São José, em Goytacazes. Convém registrar que o FUNDECANA iniciou suas operações apenas em 2007, mas os empréstimos do FUNDECAM ao setor sucroalcooleiro já vinham ocorrendo antes, desde 2003.

Naquele ano, o fundo financiou a planta industrial da Usina Álcool Química Cana Brava Ltda., no valor de R$ 3,217 milhões (contrato assinado em 03/06/2003). Em 2004, a empresa obteve novo empréstimo de R$ 1,8 milhão (contrato em 27/03/2004). Ainda em 2004, produtores de cana de Campos, reunidos na COAGRO, arrendaram a Usina São José e buscaram no FUNDECAM financiamento de R$ 10,496 milhões (contrato de 21/04/2004).

Assim, em um curto intervalo entre 2003 e 2004, duas usinas de açúcar e álcool receberam do FUNDECAM R$ 15,513 milhões em valores correntes, destinados à reestruturação industrial. Apenas dois anos depois, em 2006, o setor voltou a ser contemplado pelo poder público municipal com a criação do FUNDECANA, voltado ao revigoramento da lavoura de cana.

Diante desses episódios, permanece a indagação: após a falência do parque sucroalcooleiro de Campos nos anos 1990, conforme relatado no primeiro capítulo, teriam forças políticas e econômicas, com vínculos estreitos com o poder público municipal, buscado reerguer a agroindústria campista por meio do FUNDECAM e do FUNDECANA, utilizando recursos dos royalties e da participação especial?”

Essa foi a pergunta que nós respondemos na conclusão da nossa dissertação.

 


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